"Ensaios Etnográficos ..." na Praia pela Uni - CV


A Universidade de Cabo Verde (Uni-CV) lança, quinta-feira, 21, na Cidade da Praia, a obra “Ensaios Etnográficos na Ilha de Santiago de Cabo Verde; Processos Identitários na Contemporaneidade”.

Com esta obra colectiva a Universidade pública, por um lado, documenta em livro seis estudos/ensaios realizados no âmbito de um mestrado em Ciências Sociais, envolvendo a Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Por outro lado, com a publicação de “Ensaios Etnográficos na Ilha de Santiago de Cabo Verde; Processos Indentitários na Contemporaneidade” a Uni-CV coloca ao estante do leitor “um grande avanço no auto-conhecimento da sociedade cabo-verdiana” lê-se da pena do Reitor da Uni-CV, no prefácio ao livro.
António Leão Correia e Silva observa que o livro traz “algumas tendências emergentes, que marcam dinâmicas de recomposição social na sociedade cabo-verdiana”. É de Correia e Silva também a afirmação de que “ o mérito desta publicação científica é que ela almeja inaugurar uma nova geração de cientistas sociais”.
Os autores da colectânea de ensaios são – hoje – todos mestres em Ciências Sociais pela Universidade de Cabo Verde.





Construção Patrimonial da Cidade Velha: usos políticos, turísticos e identitários, por Flavia Lenira dos Santos; Craveiro Lopes – bairro de músicos e músicos do bairro: a diferença que o bairro faz ou a diferença que a música faz?, de Cármen Liliana Furtado; Mandjakus em Praia: etnografando trajectórias de imigrantes da Costa Ocidental de Africa, ensaio de Eufémia Vicente Rocha, Txoru Falado e Txoru cantado, representações sociais da morte no espaço rural de Achada Falcão, um trabalho de Maria Madalena Correia; Fornadja, campo e casa – espaços em transformação: o caso da Ribeira de Principal, estudo de Carla Carvalho; e Rabelados no Bacio e no Espinho Branco: pontes e portas na (re)formulação identitária do grupo, por Maria de Lourdes Gonçalves são os seis ensaios que dão conteúdo ao volume de quase 300 páginas.





A obra inaugura a série Estudos Sociais Cabo-verdianos das Edições Uni-Cv e tem como organizadores os brasileiros Maria Elizabeth Lucas e Sérgio Baptista da Silva da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. O livro será lançado nas instalações da Reitoria da Universidade de Cabo Verde no próximo dia 2, pelas 18h00, tendo como apresentadores os professores José Carlos dos Anjos e Marcelo Galvão Baptista.

Adeus, kodê


O músico e compositor Kodê di Dona foi a enterrar na tarde desta quarta-feira, 06 de Janeiro, no Cemitério da Várzea, na Cidade da Praia. O cortejo foi seguido por autoridades culturais, e do poder local, activistas culturais, admiradores, familiares e amigos do acordeonista e intérprete vocal, falecido ao anoitecer de terça-feira na Capital do País, vitimado por doença.

Kodê di Dona que há 69 anos ( 10/07/1940) nascia para o acordeão ou gaita, como o instrumento é denominado em Santiago, trocou Vale da Custa em São Francisco, onde residia, por um túmulo na Cidade Praia Maria que adjectivou de bunitu, numa das suas canções célebres. Agora descansa no cemitério da Várzea da Companhia, bairro onde viveu alguns anos da adolescência.

A morte de Kodê tocou particularmente os familiares e amigos - no geral a Cultura cabo-verdiana – que. na tarde desta quarta-feira, chorou nas avenidas da Capital a morte de um dos maiores tradicionalistas do Funaná, género que granjeou-lhe a admiração de milhares de cabo-verdianos.

Ao longo do cortejo uma orquestra de músicos com ligações diversas a Kodê di Dona interpretaram, em tom de lamento, algumas das composições do malogrado como “Fomi 47” ou “Febri Funaná”.

“Julgo que Kodê di Dona foi a nossa fonte para a estilização do Funaná. Não porque participou activamente nos arranjos e nas concepções rítmicas, mas por ter com ele aprendido a tradição”. Foi com este depoimento que Zé Mário, vocalista do extinto conjunto Bulimundo, sintetizou a percepção da importância de Kodê di Dona do êxodo do Funaná; partindo para o urbano mas mantendo-se apegado à raiz tradicional.

Zé Mário foi apenas uma dos artistas que se fez presente ao lado de Kim Alves, Zé Timas, Zeca Nha Reinalda, Kaká Barbosa, entre outros; uma fila enorme de renomados activistas em várias áreas da arte e cultura cabo-verdianas.
A morte de Kodê di Dona relançou a discussão sobre a temática da valoração e valorização dos criadores e produtores cabo-verdianos. É que muitos, na intimidade do lar, vivem quase que na miséria, uma situação que contrasta com a audácia em palco.

António Lopes, vereador da Câmara Municipal da Praia, julga por isso que mais do que inventariar soluções se passe a acção. “Temos que agir por forma a garantir dignidade financeira aos nossos produtores de cultura. Os poderes central e local devem legislar e regulamentar mas e sobretudo incentivar a criação de um mercado que possibilite que, neste caso, os músicos consigam valorar-se pelo seu trabalho”, disse.

De toda a Ilha de Santiago vieram centenas de cabo-verdianos e até mesmo turistas que quiseram testemunhar a partida de Kodê di Dona. Kodê - antigo guarda florestal, o mais tradicional dos acordeonistas da terra -, percebe-se, ficará eternizado pelo Funaná, música que só na década de 70, empiricamente pelo Opus 7, e depois (1979) pelas mãos de Bulimundo passou a conhecer a Cidade da Praia, o País para, agora, ser cartaz no estrangeiro.

Algo com que certamente Kodê, na ida época colonial, não sonhara, pois que naquele tempo, apesar de tocar o Funaná, nas ribeiras e nos cutelos de Santiago, o género era para as autoridades de então nada mais do que um ritmo ruidoso. Pelas ruas da Praia esta quarta-feira, ao som do Funaná Kodê di Dona foi a enterrar, deixando aos filhos os seus dotes musicais, com os quais gravou um dos seus dois álbuns.